sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O que dar para o homem que tem tudo?


Será que Tim Sale tem noção do quanto
sua arte é perfeita?
 Esta pergunta foi feita por Batman em um "aniversário" de Superman, quando as histórias em quadrinhos da DC Comics passaram por sua mais significativa mudança após a Crise nas Infinitas Terras. Afinal de contas, Superman não precisava de nada, que presente dar, então?

Quando lemos "Superman - As quatro Estações" (Jeph Loeb - roteiros - , Tim Sale - desenhos - e Bjarne Hansen - cores - ) escrita há doze anos chegamos à conclusão que é mais fácil dar um presente ao homem de aço do que imaginamos. Tudo o que ele precisa é que a solidão dentro dele se vá.

Pense na história de Kal-El. Enviado de longe por seu pai, fugindo de um mundo que se destruía para salvar um mundo que ainda tinha esperanças, com capacidades especiais, pode voar, entortar aço, mudar o curso dos rios e, mesmo, da história.

A trama mosaica, criada por Jerry Siegel e Joe Shuster (judeus, lembrem-se), nos mostra alguém que passa a viver em um mundo ao qual não pertence. Não consegui evitar me identificar com Clark, adolescente, inquieto, vivendo fora de sua realidade, sabendo que, com tudo o que tinha para oferecer, tinha o peso do mundo sobre suas costas. Não há como não se sentir tocado pelo mito do herói solitário, destinado a salvar a humanidade, o Deus Ex-Machina, a força externa que todos esperam.

Pôr-do-sol: Um oferecimento de Tim Sale e Bjarne Hansen

Tanta responsabilidade, tanto peso, tanta solidão. Ele não consegue se encaixar no mundo. Smallville é muito pequena para o Superman enquanto Metropolis é muito grande para Clark Kent. Afinal, como diria Lois Lane em outra história do Superman, "você pode tirar o caipira de Smallville, mas não consegue tirar Smallville de dentro do caipira".

Por não fazer parte de nenhum destes mundos, Clark sente-se sozinho. Tem sobre si a responsabilidade de mudar o curso da realidade. Ele, a personificação da perfeição, o Super-homem Nietschiano representado em azul e vermelho, a meta, o objetivo, o príncipe encantado, citando Lois Lane novamente, sente-se só e amedrontado por sua própria perfeição.


O ícone, o totem, aquele que admiramos e reconhecemos como o melhor de nós
O medo é fruto do homem atrás da capa, Clark Kent, uma personagem muito mais forte que o arquetípico Superman. O homem cheio de medos e inseguranças, o caipira que tem o poder para dominar o mundo, mas que é remoído pela dor de não ter ajudado quando um tufão varreu Smallville. Aquele caipira que não impediu a heroína, sua fã, de morrer, aquele homem simples que entra em crise quando chega a uma conclusão diferente da que as outras pessoas chegam. "Eu posso entortar aço, mas posso entender a fragilidade da condição humana?"

A condição humana estampada nos olhos do Superman. Até os heróis têm dúvidas

Enquanto Superman se equipara a Moisés, Clark Kent é quase Lucienne Chardon, a personagem principal do livro "Ilusões Perdidas" de Balzac. O caipira que vai à cidade e é engolido por ela. Clark não se encontra. Como na música do Gil, "por ser de lá, do sertão, lá do serrado", ele quase não fala, quase não tem amigos, quase que não consegue viver na cidade sem se ver contrariado.
Isto sempre me foi caro na mitologia do homem de aço. Esta sensação de não pertencimento, este incômodo que ele sente por não fazer parte de lugar nenhum, uma melancolia que nenhum de nós, simples mortais, pode entender.

Será que não podemos mesmo?

Não há lugar como nosso lar. Um dos quadros mais bonitos das HQ's de todos os tempos

 
Justamente por entendermos como Clark se sente é que "Superman - As quatro estações" é tão bela e humana. Encontrar seu lugar no mundo não é um "trabalho para o Superman", mas para todos nós, simples humanos. "Eis o homem", podemos afirmar, apontando para o ícone, Jeph Loeb nos convida a ver além do totem, atrás dos braços que entortam aço existe um coração humano, movido pelos mesmos sentimentos, medos, inseguranças que qualquer pessoa comum tem todos os dias.

Um comentário:

Carlos Ferreira disse...
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